Psiquismo dividido

O ser humano, tendo diversas experiências diferenciadas, costuma dar perfis autônomos às várias situações que enfrenta durante a vida. Dessa forma, ora somos muito introspectivos, ora somos vítimas inconsequentes de nossos erros exteriores. Assim, nós nos apresentamos divididos a cada reação que temos de desempenhar, ou também a cada situação particular em que temos de agir. Ora, tais rupturas psíquicas indicam falta de unidade em nossos desempenhos, demonstrando quanto ainda precisamos evoluir diante de nossas variadas situações, com vistas a uma integração saudável de nosso mundo interior.

As pessoas jovens são as que mais sofrem em relação a isso, em função dos diferentes apelos a que são submetidos, pela necessidade de afirmação de uma personalidade em processo de formação, cujos estímulos hormonais estão à flor da pele e tudo estando para ser definido: estudos, trabalho, vocação, etc; não obstante, necessitam demonstrar certa continuidade de propósitos, para que assim não venham a perder a coerência na continuidade harmônica de seu futuro.

Ora, os psicólogos têm observado que nossa integração psíquica precisa considerar quatro dimensões implicadas que, se mantidas em harmonia, nos ajudarão decisivamente na manutenção de nossa saúde mental, porque não dizer, psíquica e espiritual. Assim, a primeira dimensão é a de nossa subjetividade (eu); a segunda, de nossas dependências corporais e materiais (ele); a terceira, do ambiente cultural que nos afeta (nós); e a última, das instituições sociais que nos dominam (eles):  família,  religião, nossos contatos, o trabalho.

No que se refere à primeira dimensão, a da subjetividade, os desajustes ora se referem a um excesso de preocupações subjetivas, o que conduz às obsessões e aos distúrbios mentais, frutos de anomalias resultantes de uma imperfeita compreensão de como nosso eu deve estar relacionado com as outras dimensões que o influenciam: as dependências corporais (ele), nossas relações com a cultura (nós), ou nossos laços de submissão às  pressões sociais (eles).

Como já citada, a segunda dimensão de nosso psiquismo a ser levada em conta é aquela referente aos condicionamentos externos ao nosso eu, a tendência a reduzir nossa subjetividade apenas a um epifenômeno da matéria, como se tornou comum entre os psicólogos modernos. Empiricismo, mito do dado, desconhecimento da intersubjetividade, análises cerebrinas, são as diversas perspectivas distorcidas que acabam por reduzir nosso eu a um puro fenômeno psicofísico.

As diferenças nítidas entre o individual e o social nos conduzem a verificar que entre o eu e a coletividade há uma forte predominância desta, de tal forma que somos mais seres sociais do que indivíduos. Nosso psiquismo se vê assim prisioneiro de inúmeras formas de coerção, que estão a condicionar constantemente nosso eu à predominância do nós. Ora, importa que possamos manter nossas ações não completamente dependentes do meio  social, assim assegurando nossa relativa individualidade ou  autonomia pessoal.

Por fim, temos que considerar o peso que as instituições estabelecidas pelo mundo exterior nos submetem a seus modismos, de tal forma que, se quisermos gozar de um mínimo de relativo equilíbrio, necessário se faz mantermo-nos submissos a suas exigências, reconhecendo a presença do Estado e das leis que nos orientam na ação. Autoridades e procedimentos estabelecidos forçam nossa submissão ao poder político e às ideologias.

O que fazer, pois, para encontrar a vivência integral de nosso psiquismo? A resposta só poderá ser obtida através de uma visão holística das variadas situações ou desafios a superar, num elenco dinâmico de escolhas. Como exemplo, citamos os seguintes referenciais de consciência ativa, conforme proposta de KEN WILBER (Espiritualidade Integral. SP, Ed Aleph, 2010, p. 85):

  • linha cognitiva: tenho desenvolvido harmonicamente as dimensões subjetivas, objetivas, culturais  e  ideológicas que envolvem meu eu, a partir do perfil de minha personalidade
  • linha do autoconhecimento (self): Onde se encontra meu verdadeiro eu?
  • linha das preferências (valores): como tenho procedido minhas escolhas?
  • linha moral (ética): o que devo preferir, na divergência entre querer e dever
  • linha interpessoal: como estão meus relacionamentos?
  • linha espiritual: em que intensidade estão minhas vivências com o sobrenatural
  • linha do conforto: quais são minhas verdadeiras necessidades materiais
  • linha da higidez corporal: que cuidados tenho mantido com meu corpo, para mantê-lo saudável?
  • linha emocional: mantenho em equilíbrio meus sentimentos, sem excessos doentios?
  • linha estética: tenho cultivado minhas emoções estéticas, apreciando a beleza de todas as coisas?