Afinal, o Direito é ou não é tridimensional?

A pergunta vem a propósito do julgamento dos réus do mensalão pelo STF, que segundo se depreende pelas declarações de seu recém-empossado presidente, Joaquim Barbosa, o magistrado não deve se imiscuir com aspectos políticos em seus julgamentos.

Não obstante, durante todo o século passado, um grande jurista brasileiro, MIGUEL REALE, defendeu a tese de que o direito possui três dimensões em dialética de implicação e polaridade, segundo o paradigma das leis, dos valores e dos fatos sociais que geram os delitos.

Ora, segundo tal perspectiva, o magistrado, quando na função de aplicador da lei, não deveria apenas subsumir a pena ao tipo penal, mas deve ter em mente que se trata sempre:

  1. de um caso específico
  2. envolvendo pessoas de carne e osso, em situações peculiares
  3. o ato interpretativo é sempre compreensivo
  4. captando o sentido ou a natureza própria do delito

Dessa forma, quando os integrantes da Suprema Corte enquadram os réus do mensalão como meliantes que infringiram as leis, sem levar em conta as características próprias no exercício de atividades políticas, cometem a tentação de supor que a justiça consiste apenas em aplicar a lei segundo os tipos penais, a tese cara a todos os dogmatismos legalistas (KELSEN).

Na continuidade, como se demonstra pela semiótica do direito, qualquer julgamento processual traz consigo sejam perspectivas de valor, sejam perspectivas ideológicas, o que o torna comprometido inelutavelmente com os subjetivismos de vontade, não declarados pelo julgador!

Como nos lembra BOBBIO, há que distinguir entre uma teoria e uma ideologia da justiça, o que implica que o direito não consiste apenas na aplicação fria da lei (teoria da justiça), mas envolve também um ideal de justiça a ser concretizado, a partir da apreciação judiciosa de sábios magistrados.

Está-se percebendo que o STF não está levando em conta o caráter político dos crimes cometidos, como aconteceu na divergência manifestada por ocasião do julgamento de formação de quadrilha, no caso de José Dirceu.

Por tudo isso, nota-se que o direito científico anda muito carente de doutrina, o que acaba por causar sérios danos à atividade jurídica.