Os dualismos não se opõem, se co-implicam

Nossa impressão imediata é a de que os dualismos são realidades antagônicas, opostos que se contrapõem como excludentes. Assim ocorre entre o bem e o mal, a vida e a morte, a saúde e a doença, o sucesso e o fracasso, o início e o fim, tudo parecendo contraditório. Muitas doutrinas antigas, principalmente aquelas oriundas do Oriente, a partir de Zoroastro, consolidaram uma tradição que vê nos dualismos uma oposição radical, como uma luta perene entre realidades que não se misturam.

Já o Ocidente, a partir do cristianismo, tem considerado os dualismos como realidades aparentes e que encontram num só Criador a hegemonia do Bem, como momentos dialéticos ou desafios que estão a demandar, constantemente, as suas superações. Tal é a concepção recorrente de grandes pensadores, como São Paulo, Sto. Agostinho, Santo Tomás, Leibniz e Hegel, entre outros.

Ora, isto demanda uma transformação radical nas formas de encarar os dualismos, como momentos intrínsecos à dinâmica da criação, que só existem como oposições necessárias à colimação de objetivos que consolidam o melhor, segundo os propósitos humanos, mas não indiferentes à ordem natural (sic). Assim ocorre entre os dualismos vida/morte, saúde/ doença, como momentos aparentes de oposição, mas necessários para manter a dinâmica e o equilíbrio da criação. Igualmente, tais  dualismos  são encontrados também no mundo dos átomos, cujo desempenho é sempre motivado pela oposição entre partículas positivas e negativas em constante pulsão, provocando o surgimento da luz. Sem estes momentos simultâneos de atração e repulsão, não haveria universo criado.

Como nos demonstra o anagrama coreano, yang e yin estão entrelaçados num gesto de aparente oposição, sem, contudo, deixarem de ser interdependentes. A realidade maior é a indicação de que qualquer forma de dualismo implica uma realidade complementar que o integra. Dessa forma, o dualismo entre o bem e o mal  demanda a existência de um estado superior que o neutralize, conforme o valor que possa concretizar.

Dessa forma somos conduzidos a considerar que os dualismos estão a serviço de uma terceira dimensão, um tertius cuja origem é de natureza não apenas natural, mas também  sobrenatural: uma tese, antítese e síntese semelhantes à realidade trina do Criador. Nessa linha de raciocínio, os dualismos existem como formas provisórias, sugerindo a dialética de sua superação, dando coerência aos aparentes conflitos que constroem a realidade.

Assim é que devemos considerar a imortalidade de nossa alma pessoal, tendo em vista que o dualismo vida/morte implica um terceiro momento que evita a frustração de uma vida que pareceria em vão. Ora, este é o coroamento de coisas que foram criadas não para serem simplesmente contrárias, mas sim para realizar um projeto em plenitude de sentido.

Ainda mais, pela revelação da ressurreição de Cristo como primícias de nossa imortalidade, fica consagrado o princípio natural de nossa sobrevivência, o coroamento natural que funciona como uma graça, retribuição à nossa fragilidade. Como expressa São Paulo: ”Com efeito, é necessário que este ser corruptível revista a incorruptibilidade, e que este ser mortal revista a imortalidade” (I Cor 15,54).