Espírito e conciliação

A palavra dialética foi criada pelos gregos, há muitos séculos, como uma técnica do discurso, ou a arte na altercação dos argumentos, com vistas a se alcançar a verdade. Foi assim com HERÁCLITO, SÓCRATES, PLATÃO e ARISTÓTELES, entre muitos outros. Por extensão, a dialética passou também a dizer respeito às condições contraditórias da Natureza, facilmente detectáveis no fato constante das transformações que afetam todas as coisas, surgindo e desaparecendo num constante devir.

Em prosseguimento, na era moderna, coube a HEGEL, entre os séculos XVIII e XIX, entender a dialética em sentido puramente espiritual, como condição para tornar possível o entendimento completo  das mútuas implicações entre o pensar e o existir. Ora, esta dialética, a íntima implicação de coisas que se relacionam, se contradizem e se harmonizam, pode ser compreendida em três momentos: tese, antítese e síntese, como estágios provisórios que demandam um constante processo de superação, sem o qual fica difícil o seu entendimento como potencialidades do Espírito que se manifesta. Ou seja, pensamento (espirito subjetivo) e  realidade (espírito objetivo), demonstram ter relações de dependência com algo que os transcende, o espírito absoluto.

Em complemento, com ENGELS, companheiro de MARX, passamos a compreender a dialética em sentido puramente material, a constatação de que a Natureza se mantém num processo contínuo de luta pela sua própria sustentação, mas que para se criar, necessita da destruição contínua de suas fontes de poder. Para tanto, importa apenas entendermos a dialética hegeliana em sentido materialista, o que significa uma redução falsa de todas as evidências, que constantemente testemunham a presença virtual do Espírito em tudo o que ocorre, seja na Natureza, seja em nossa mente.

Contudo, coloca-se a questão se a dialética é mesmo um processo natural ou apenas uma elucubração de nossa mente, o que acaba por confundir as posições de HEGEL e ENGELS, colocando-as num mesmo patamar de interpretações heurísticas (tese, antítese e síntese). Aqui, é necessário aceitar previamente a noção de totalidade, sem a qual resulta impossível   conciliar pensamento e realidade exterior, que não seriam antagônicos, mas complementares.

Por consequência, a dialética espiritual ressalta, por meio dos mecanismos de suas três leis (a inter-relação dos contrários,  a transformação da quantidade em qualidade, e a negação da negação), a importância de superação dessas oposições, pelo reconhecimento de que há sentido em tudo que foi criado, pois nada se acaba ao se destruir, como a semente que precisa morrer para germinar. Ora, as implicações dogmáticas e religiosas dessas perspectivas tornam-se por demais evidentes. Aceitando Deus como fonte do Poder (tese), o Filho seria a Sua antítese, o Cristo Humano e Divino, que assume, com seu sofrimento, as limitações que condicionam todos os seres criados. Em complemento, a Presença do Espírito Santo em Maria significa a superação daquela contradição, por Sua capacidade de ser virtual, de acolhimento e amor, presente em todos os seres femininos.

Em assim sendo, o Espírito é Conciliador por ser afirmativo nas desconfianças, forte na superação das fraquezas, concreto nas virtualidades simbólicas, consolador em nossos fracassos e afirmativo em nossas contrariedades.